E foi assim, o país estava consumido
pelas dificuldades políticas geradas pela instalação do Regime Civil Militar de
1º de abril de 1964, e a saída para os militares no poder foi a outorga do Ato
Institucional nº 5, de 13 de dezembro de 1968.
O diploma extralegal marcou o início
do período mais duro da ditadura militar (1964-1985). Foi editado pelo então
presidente Arthur da Costa e Silva, dando ao regime uma série de poderes para
reprimir seus opositores. Entre as faculdades atribuídas aos usurpadores do
poder federal estavam o de fechar o Congresso Nacional e outros legislativos
(medida regulamentada pelo Ato Complementar nº 38), cassar mandatos eletivos,
suspender por dez anos os direitos políticos de qualquer cidadão, intervir em
Estados e municípios, decretar confisco de bens por enriquecimento ilícito e
suspender o direito de habeas corpus para crimes políticos. O ministro da
Justiça, Gama e Silva, anunciou as novas medidas em pronunciamento na TV na
mesma noite.
O ato discricionário produziu uma
imensa transformação dos ânimos políticos, e o fato de o regime ter permitido a
existência de um legislativo subserviente e legitimador haveria de ter nefastas
consequência para o futuro político do Brasil. Os primeiros efeitos do AI-5
foram percebidos naquela mesma noite.
O Congresso é fechado, o ex-presidente
Juscelino Kubitschek, ao sair do Teatro Municipal do Rio –onde tinha sido
paraninfo de uma turma de formandos de engenharia– foi levado para um quartel
em Niterói, onde permaneceu preso num cubículo por vários dias, sem roupa para
trocar e nada para ler.
O ex-governador da Guanabara Carlos
Lacerda foi preso no dia seguinte pela PM e após uma semana em greve de fome,
conseguiu ser libertado. Para driblar a censura, o "Jornal do Brasil"
tenta dar a dimensão dos acontecimentos na sua seção de meteorologia:
"Previsão
do tempo:
Tempo negro.
Temperatura
sufocante.
O ar está
irrespirável.
O país está
sendo varrido por fortes ventos.
Máx.: 38º, em
Brasília.Mín.:5º, nas Laranjeiras.
(Publicado no
Jornal do Brasil, no dia seguinte à decretação do AI-5)
No dia 30 de dezembro já se
apresentava a primeira lista de cassações, com 11 deputados federais _dentre
eles Márcio Moreira Alves (MDB-RJ), Hermano Alves (MDB-RJ) e Renato Archer
(MDB-MA). A segunda lista, de 19 de janeiro de 1969, incluiu dois senadores, Aarão Steinbruck e João Abraão, 35 deputados federais, três ministros do STF
(Supremo Tribunal Federal), Hermes Lima, Vítor Nunes Leal e Evandro Lins e
Silva, e um ministro do STM (Superior Tribunal Militar), Peri Constant
Bevilacqua, que, segundo escreveu o porta-voz de Costa e Silva, Carlos Chagas,
era acusado de "dar habeas corpus demais".
Três meses após a edição do AI-5, encarregados
dos inquéritos políticos passaram a poder prender quaisquer cidadãos por 60
dias, dez dos quais deveriam permanecer incomunicáveis. "Em termos
práticos, esses prazos destinavam-se a favorecer o trabalho dos
torturadores", conta Elio Gaspari no livro "A Ditadura
Envergonhada". Sessenta e seis professores foram expulsos das
universidades –dentre eles Fernando Henrique Cardoso, Florestan Fernandes e
Caio Prado Júnior. Emissoras de televisão e de rádio e redações de jornais
foram ocupadas por censores. Artistas como Marília Pêra, Caetano Veloso e
Gilberto Gil foram os primeiros a conhecer as carceragens da polícia política.
O período, farto em violações de
direitos fundamentais e políticos ficou marcado pela prisão de 333 políticos,
que têm seus direitos políticos suspensos em 1969 (dos quais 78 deputados
federais, cinco senadores, 151 deputados estaduais, 22 prefeitos e 23
vereadores). O Congresso permanece fechado até outubro, ou seja, não havia
legislativo no Brasil, e após a promulgação da Emenda Constitucional n.1 de
1969 por uma junta militar, que de fato era uma nova carta ditatorial, e só
então o legislativo é reaberto para eleger Medici.
O AI-5 foi seguido por mais 12 atos
institucionais, 59 atos complementares e oito emendas constitucionais teria sua
vigência estendida até 17 de outubro de 1978. Sobre ele disse Costa e Silva, em
discurso transmitido por rádio e TV, no último dia de 1968: "Salvamos o
nosso programa de governo e salvamos a democracia, voltando às origens do poder
revolucionário". Em 13 de janeiro de 1969, o coronel João Batista
Figueiredo, futuro chefe da Agência Central do SNI (Serviço Nacional de
Informações) e futuro presidente da República (1979-1985), mandava carta a
Heitor Ferreira, secretário de Geisel e Golbery: "Os erros da Revolução
foram se acumulando e agora só restou ao governo 'partir para a
ignorância'".
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